Queda nos juros é positiva, mas trabalhadores e empresários veem redução lenta
Sindicalismo e setor produtivo ainda pressionam por maior redução de
juros, enquanto Copom condiciona com exigência de cumprimento de
metas do governo
O Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central (BC)
anunciou mais uma redução na Taxa Selic, os juros básicos da
economia, confirmando uma tendência que vem se desenhando nos
últimos meses. A decisão de reduzir a Selic em 0,5 ponto percentual, de
13,25% para 12,75% ao ano, foi recebida com entusiasmo pelo mercado
financeiro e pelo governo, gerando expectativas e sinalizando um
caminho para a política monetária no país. No entanto, o setor produtivo
que precisa de crédito baixo, reclama da lentidão do processo, enquanto
o setor financeiro pressiona por rigor fiscal no governo.
Para o ministro interino da Fazenda, Dario Durigan, a decisão do Copom
é um “bom sinal” para a economia. Durigan destacou que a comunicação
do Banco Central, indicando que a queda da Selic deve continuar nas
próximas reuniões, proporciona previsibilidade para os agentes
econômicos.
Todos os agentes financeiros, no entanto, destacaram o tom duro
(hawkish) da ata que condiciona as próximas quedas ao cumprimento
das metas fiscais rígidas anunciadas pelo governo. Durigan ressaltou
que o governo continuará trabalhando para controlar as contas públicas
enquanto a autoridade monetária prossegue com o ciclo de redução dos
juros.
Uma das principais mensagens do Copom foi a unanimidade na decisão
de reduzir a Selic em 0,5 ponto. Isso contrasta com a reunião anterior,
em agosto, quando o corte foi decidido por uma margem apertada de 5 a
4, com o presidente do BC, Roberto Campos Neto, sendo o voto
decisivo. No entanto, na ata do encontro anterior, ficou claro que os
membros divergentes concordavam com a continuidade dos cortes de
meio ponto nas próximas reuniões.
Passo de tartaruga
O comunicado do Copom também sinalizou a intenção de manter a
redução dos juros em meio ponto percentual nas próximas reuniões,
indicando uma expectativa de que a Selic chegue a 11,75% no final de
2023 e a 9% no final de 2024. Lideranças dos trabalhadores e do setor
produtivo criticaram a lentidão desse processo, que acaba gerando
pouco efeito sobre o crédito para o investimento.
Dirigentes de centrais sindicais mantém desconfiança sobre a
continuidade do processo, conforme Campos Neto já demonstrou estar
alinhado com os interesses da especulação financeira. A vice-presidenta
da CUT Nacional, Juvandia Moreira, saliente que a luta continua.
“Essa mudança de rumo é positiva, mas, como sociedade civil
organizada, como trabalhadores e trabalhadoras, precisamos manter a
pressão. Se puxarmos o histórico, veremos que as decisões do Copom
são sempre baseadas no mercado e não nos interesses da população e
do desenvolvimento do país. Essa inflexão, portanto, é fruto dessa
clareza que a população vem ganhando sobre a obrigação dessa
entidade nos rumos da economia do país”, avaliou.
O presidente da CTB, Adilson Araújo, destacou o fato do comunicado
divulgado após a reunião, sinalizar a pretensão de preservar um caminho
conservador, promovendo novas rodadas de reduções mas sempre de
apenas meio ponto percentual, sob o pretexto de que o cenário “exige
serenidade”.
“Isto não corresponde às necessidades de desenvolvimento do país”,
afirmou lembrando que os juros altos deprimem o consumo e os
investimentos, condenando o país à estagnação, além de impactarem
negativamente as contas públicas, restringindo as despesas com saúde,
educação, ciência, infraestrutura, entre outras.
O dirigente da central também promete mobilização contra os juros altos.
“Não vamos ficar parados”, afirmou. “Temos de continuar pressionando,
conscientizar as bases sobre o que está em jogo e mobilizar a sociedade
pela queda substancial dos juros e a queda de Campos Neto”.
Para o presidente da Confederação Nacional das Indústrias (CNI),
Robson de Andrade, a decisão do BC evita prejuízos adicionais para o
mercado de crédito e para a atividade econômica. “É preciso reverter o
quadro negativo de concessão de crédito às empresas. Nos primeiros
sete meses do ano, o crédito recuou 5%, na comparação com o mesmo
período do ano passado”, afirma Andrade. “A redução da Selic é
necessária, não compromete o processo de combate à inflação e evita
mais restrições à atividade industrial”, completa o presidente da CNI.
Para a Federação das Indústrias do Estado do Rio Grande do Sul
(FIERGS), o Banco Central age de maneira assertiva ao trazer um sinal
de alívio para as atividades produtivas, tão afetadas com os atuais níveis
de juros e falta de confiança. Entretanto, o presidente da FIERGS,
Gilberto Porcello Petry, ressalta que a elevação da intensidade dos
cortes irá depender do comprometimento do Governo Federal com uma
política fiscal equilibrada, que é um dos pilares responsáveis por acelerar
o processo de redução das expectativas de inflação para os próximos
anos.
Já o presidente da Fecomércio-RS, Luiz Carlos Bohn, entende que
decisão seguiu em linha com o esperado. Para ele, a inflação de agosto
veio abaixo das expectativas, mostrando que há espaço para uma taxa
Selic menor. “Mesmo assim, é evidente que a taxa de juros real na
economia brasileira permanece em território bastante contracionista.
Como temos apontado publicamente, as atividades que são mais
sensíveis à dinâmica dos juros, como é o caso do comércio e da
indústria, têm sentido fortemente os impactos da política monetária
apertada aplicada”, diz.
No entanto, assim como o industrial gaúcho, Bohn assume o tom
fiscalista conservador ao dizer que os condicionantes para uma taxa de
juros mais baixa se constroem, em especial, a partir de um cenário fiscal
equilibrado, estabelecido principalmente sobre uma dinâmica sustentável
das despesas públicas e de outras reformas que enderecem aumento da
produtividade da economia brasileira no médio e longo prazo.
Condicionantes
Embora a decisão tenha sido bem recebida pelos mercados financeiros,
algumas vozes críticas alertaram para a importância da execução das
metas fiscais para garantir a sustentabilidade das políticas monetárias.
Em sintonia com o tom conservador na ata, a pressão para reduzir ainda
mais os juros é vista com cautela por alguns setores, que destacam a
necessidade de uma política fiscal equilibrada.
A Federação Brasileira de Bancos (Febraban) considerou a decisão
positiva para a economia, destacando que ela indica um mercado de
crédito menos pressionado à frente. Logo após o anúncio do Copom,
Caixa e Banco do Brasil anunciaram a redução das taxas de juros em
várias linhas de crédito para pessoas físicas e jurídicas.
No entanto, a Associação Nacional dos Executivos de Finanças,
Administração e Contabilidade (Anefac) apontou que a redução da Selic
terá um impacto limitado nas prestações e no custo do crédito devido à
grande diferença entre a taxa básica e os juros efetivos de prazo mais
longo.
A título de comparação, o juro médio para as pessoas físicas passará de
124,76% para 123,75% ao ano. Para as pessoas jurídicas, a taxa média
sairá de 60,97% para 60,23% ao ano. No financiamento de uma
geladeira de R$ 1,5 mil em 12 prestações, o comprador desembolsará
R$ 0,39 a menos por prestação e R$ 4,65 a menos no valor final com a
nova taxa Selic. O cliente que entra no cheque especial em R$ 1 mil por
20 dias pagará apenas R$ 0,27 a menos.
A decisão do Copom também teve implicações na comparação
internacional. Com a nova redução da Selic, o Brasil não lidera mais o
ranking global de juros reais. O país agora está atrás do México e da
Colômbia, destacando a necessidade de medidas adicionais para
melhorar o ambiente de negócios e acelerar o crescimento econômico.
No geral, a redução da Taxa Selic representa um sinal de alívio para as
atividades produtivas do país, que têm sentido os impactos de juros
altos. No entanto, o futuro dos cortes de juros dependerá do
compromisso do governo com uma política fiscal equilibrada e de outras
reformas que visam impulsionar a produtividade econômica a longo
prazo.
Fonte: VErmelho