TST decide que trabalho escravo é imprescritível

Para ministros, trabalho escravo é crime contra a humanidade e não se enquadra

na norma geral de prescrição

O Tribunal Superior do Trabalho (TST) decidiu que casos envolvendo trabalho
escravo são imprescritíveis na esfera trabalhista. Ao acolher o recurso do
Ministério Publico do Trabalho (MPT), os ministros reconheceram que submeter
trabalhadores à condições análogas à escravidão é um crime contra a
humanidade e, portanto, não se enquadra na norma geral de prescrição. O
julgamento ocorreu no último dia 18/10 e o acórdão foi publicado nesta sexta-
feira (27/10).
Na ação, a corte revisou o entendimento do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª
Região (TRT 2) sobre ação civil pública ajuizada pelo MPT-SP que exigia a
reparação de danos em favor de trabalhadora doméstica resgatada sob condições
análogas. O caso aconteceu em 2020, quando o Ministério Público e a Polícia Civil
de São Paulo resgataram, no bairro do Alto Pinheiros, uma trabalhadora
submetida a uma série de violações pela família que a empregava desde 1998. De
acordo com o MPT, a trabalhadora foi vítima de agressão, maus tratos,
constrangimento, tortura psíquica, violência patrimonial e exploração do trabalho.
Ao avaliar a ação, o TRT 2 entendeu que o caso estaria submetido à prescrição
quinquenal, que estabelece a reparação de danos trabalhistas referentes até os
últimos 5 anos.
Entretanto, para a relatora da ação no TST, ministra Liana Chaib,, “aplicar prazos
prescricionais trabalhistas a um indivíduo submetido a trabalho em condição
análoga à escravidão seria como puni-lo duplamente, ou mesmo revitimizá-lo,
anuindo a uma atitude criminosa e absolvendo aquele que violou direito
fundamental absoluto”.
Além disso, a ministra afirmou que a incidência da prescrição, somada a demora
na resolução das ações envolvendo trabalho escravo, enseja a impunidade e citou
casos famosos, como o da Fazenda Brasil Verde e do casal Boneti, que ganhou
repercussão após o podcast “A Mulher da Casa Abandonada”. “São lamentáveis
registros de impunidade, como esse, que deixam clara a necessidade de rápida e
de contundente mudança no ordenamento jurídico brasileiro, seja por meio da
atuação legislativa mais contundente, seja através da jurisprudência firmada nas
Cortes do Poder Judiciário”, afirmou.
Para a magistrada, não é possível aplicar a prescrição no trabalho escravo porque
não existe correlação entre um emprego regular registrado na carteira de
trabalho e um emprego com privação de liberdade, sujeito às violências e sem as
garantias previstas na legislação trabalhista. A ministra Liana Chaib destacou que
“por se estar diante de um crime contra a humanidade e de uma absurda violação
aos direitos humanos fundamentais do homem, a submissão de trabalhador à
condição análoga a escravo, prática odiosa e de tamanha gravidade e
perversidade que permite excepcionar a norma geral sobre a prescrição
trabalhista”.
“Como explicar ao trabalhador que esteve submetido, às vezes por décadas, à
condição análoga à escravidão, que os seus direitos mais basilares foram
consumidos pela prescrição? Antes de encerrar a concretização de uma grave
violação aos direitos humanos, aplicar a prescrição, em tal circunstância, importa
na premiação ao transgressor das garantias fundamentais do ser humano
enquanto trabalhador”, acrescentou.

O TST aplicou o entendimento firmado na Súmula nº 647 do Superior Tribunal de
Justiça (STJ), que reconheceu imprescritibilidade das ações indenizatórias por
danos morais e materiais decorrentes de atos de perseguição política com
violação de direitos fundamentais durante a ditadura militar.
Em nota, a Coordenadoria Nacional de Erradicação de Combate ao Trabalho
Escravo e Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas (Conaete) do MPT destacou que a
decisão é importante avanço no combate ao trabalho escravo no país porque
reconhece a imprescritibilidade do direito de requerer judicialmente a reparação
dos danos individuais e coletivos decorrentes do trabalho escravo. “Isso significa
que não se aplica a prescrição aos casos de trabalho escravo no Brasil. A qualquer
tempo, a vítima de trabalho escravo ou os órgãos com legitimidade, inclusive o
MPT, podem ajuizar ações pedindo a reparação dos danos”, explicou Aragão.
A decisão determinou que os empregadores paguem uma indenização por danos
morais coletivos fixada em R$200 mil e R$100 mil pela condenação.
O Acórdão está disponível com número TST-RRAg-1000612-76.2020.5.02.0053
Fonte: Jota

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