Brasil tem 32 milhões de crianças e adolescentes na pobreza

Relatório do Unicef utiliza dados da PNAD e revela piora. Norte e
Nordeste têm cerca de 90% das crianças sofrendo algum tipo de

privação.

Imagem da capa do relatório divulgado pela Unicef
Pelo menos 32 milhões de meninos e meninas no Brasil vivem na
pobreza. O número representa 63% do total de crianças e adolescentes
no país e abarca a pobreza em diversas dimensões: renda, alimentação,
educação, trabalho infantil, moradia, água, saneamento e informação. É
o que indica a pesquisa  As Múltiplas Dimensões da Pobreza na Infância
e na Adolescência no Brasil , divulgada hoje (14) pelo Fundo das Nações

Unidas para a Infância (Unicef).

A pesquisa destaca que a pobreza na infância e na adolescência vai
além da renda e inclui aspectos como, por exemplo, estar fora da escola,
viver em moradias precárias, não ter acesso à água e saneamento, não
ter uma alimentação adequada, trabalho infantil e não ter acesso à
informação, fatores considerados privações e que fazem com que tantos
meninos e meninas estejam inseridos nesse contexto de pobreza
multidimensional.

Marcello Casal/Agência Brasil

O relatório utiliza dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios
(Pnad Contínua) e os resultados, conforme a própria entidade, revelam
um cenário preocupante. O último ano, para o qual há informações
disponíveis para todos os oito indicadores, é 2019 – quando havia 32
milhões de meninas e meninos de até 17 anos de idade privados de um
ou mais desses direitos. Para os anos seguintes, só há dados de renda,
alimentação e educação – e os três pioraram.
Em 2021, o percentual de crianças e adolescentes que viviam em
famílias com renda abaixo da linha de pobreza monetária extrema
(menos de US$ 1,9 por dia) alcançou o maior nível dos últimos 5 anos:
16,1%, contra 13,8% em 2017. O contingente de menores privados da
renda necessária para uma alimentação adequada passou de 9,8
milhões em 2020 para 13,7 milhões em 2021 – um salto de quase 40%.
Já na educação, após anos em queda, a taxa de analfabetismo dobrou
de 2020 para 2022 – passando de 1,9% para 3,8%.
“A pobreza multidimensional impactou mais quem já vivia em situação
mais vulnerável – negros e indígenas e moradores das regiões Norte e
Nordeste –, agravando as desigualdades no país. Entre crianças e
adolescentes negros e indígenas, 72,5% estavam na pobreza
multidimensional em 2019, versus 49,2% de brancos e amarelos. Entre
os estados, seis tinham mais de 90% de crianças e adolescentes em
pobreza multidimensional, todos no Norte e Nordeste.”
Entre as principais privações que impactam a infância e a adolescência,
segundo o Unicef, estão a falta de acesso a saneamento básico
(alcançando 21,2 milhões de meninas e meninos), seguida pela privação
de renda (20,6 milhões) e de acesso à informação (6,2 milhões). A elas
se somam a falta de moradia adequada (4,6 milhões), a privação de
educação (4,3 milhões), a falta de acesso à água (3,4 milhões) e o
trabalho infantil (2,1 milhões).

As orientações da entidade para o Brasil incluem priorizar investimentos
em políticas sociais; ampliar a oferta de serviços e benefícios a crianças
e adolescentes mais vulneráveis; fortalecer o Sistema de Garantia de
Direitos da Criança e do Adolescente; promover a segurança alimentar e
nutricional de gestantes, crianças e adolescentes; implantar políticas de
busca ativa escolar e retomada da aprendizagem, em especial na
alfabetização; e priorizar a agenda de água e saneamento.

Análise
Para a chefe de Políticas Sociais, Monitoramento e Avaliação e
Cooperação Sul-Sul do Unicef no Brasil, Liliana Chopitea, a pobreza

multidimensional é diferente do conceito de pobreza tradicional. “É o
resultado da interação entre privações e exclusões a que crianças e
adolescentes estão expostos”, explicou, durante coletiva de imprensa.
“Os dados mostram desafios estruturais e que as desigualdades
regionais, raciais e de gênero persistem infelizmente no Brasil, apesar de
todos os esforços feitos nas últimas décadas”, avaliou. “O cenário se
tornou ainda mais desafiador durante e após a pandemia”, completou, ao
citar a piora em indicadores como renda, alimentação e educação no
período de 2020 a 2022.
Liliana lembrou que o Brasil foi um dos países que permaneceu por mais
tempo com as escolas fechadas em razão da covid-19 e os impactos
para a educação, segundo ela, foram muito importantes. O país, segundo
ela, ainda registra crianças que não retornaram para a escola. “O
analfabetismo é uma das dimensões que preocupam bastante, chegando
a 3,1% das crianças e adolescentes em 2020”.
“É muito importante priorizar os investimentos em políticas sociais”,
disse. “Importante que sejam feitos uma medição e o monitoramento das
diferentes dimensões da pobreza e suas privações por um órgão oficial
do Estado. E que seja feito de forma periódica”, completou, ao destacar
ainda a adoção de formas de detectar precocemente famílias vulneráveis
e a promoção e o fortalecimento de oportunidades no ambiente escolar.

Recomendações
Na lista de nove recomendações de políticas públicas para reduzir estes
índices, o estudo aponta:
Priorizar investimentos em políticas sociais;
Ampliar a oferta de serviços e benefícios às crianças e aos(às)
adolescentes mais vulneráveis;

Fortalecer o Sistema de Garantia de Direitos da Criança e do
Adolescente;
Implementar medições e o monitoramento das diferentes dimensões da
pobreza e suas privações por um órgão oficial do Estado;
Promover a segurança alimentar e nutricional de gestantes, crianças e
adolescentes, garantindo a eles(as) o direito humano à alimentação
adequada e reduzindo o impacto da fome e da má nutrição nas famílias
mais empobrecidas;
Implantar com urgência políticas de busca ativa escolar e retomada da
aprendizagem, em especial da alfabetização;
Priorizar, no âmbito das respectivas esferas de gestão, a agenda de
água e saneamento para o desenvolvimento e implementação de
políticas públicas;
Implementar formas de identificar precocemente as famílias vulneráveis a
violências, incluindo trabalho infantil;
Promover e fortalecer oportunidades no ambiente escolar e na transição
de adolescentes para o mercado laboral.

Número total mostra quantidade de crianças que sofrem de pelo menos um tipo
de privação

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