Entidades recorrem à OAB contra Ives Gandra Martins

Representação pede instauração de procedimento interno. Orientações
de teor golpista do jurista foram achadas no celular de Mauro Cid, ex-
braço-direito de Jair Bolsonaro.

A Associação Brasileira de Imprensa (ABI) e o Movimento Nacional de
Direitos Humanos (MNDH) ingressaram com uma representação no
Tribunal de Ética da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) contra o
advogado Ives Gandra Martins por entenderem que ele  violou o Estatuto
da Advocacia.
A ação, à qual o Portal Vermelho teve acesso, diz respeito a documento
armazenado no celular do ex-ajudante de ordens de Jair Bolsonaro,
Mauro Cid, no qual o jurista fazia considerações que poderiam embasar
um golpe de Estado, entre as quais a tese de “poder moderador” das
Forças Armadas, que não consta na Constituição. A representação pede
que seja instaurado um procedimento ético administrativo interno do
Conselho Federal da OAB.
A ação das entidades tem como base reportagens recém-publicadas pela
revista Veja mostrando que foram encontrados, no celular de Mauro Cid,
documentos que explicitam uma trama de bolsonaristas para tentar
anular a eleição do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o que incluía o
afastamento de ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) e a
instauração de uma intervenção militar. Um desses documentos
chamava-se “Forças Armadas como poder moderador”.

A representação aponta que “no referido plano mencionado, foi visto que
Cid armazenou no acervo de seu telefone  considerações do
constitucionalista Ives Gandra Martins, as quais delineavam situações
em que o governo poderia usar uma decretação da Garantia da Lei e da
Ordem. Além disso, a Polícia Federal encontrou avaliações do jurista as
quais afirmavam que uma suposta ‘imposição popular’ levou o governo
de João Goulart a ser deposto por um golpe militar, além de análises
sobre a alegada legitimidade das Forças Armadas serem convocadas
para conter uma crise entre os poderes”.
Também menciona que, quando questionado sobre a interpretação do
artigo 142 da Constituição, “Ives Gandra respondeu que o emprego das
Forças Armadas poderia ocorrer em situação de normalidade caso, no
conflito em questão, um dos poderes apelassem a eles, no caso de não
haver outra solução. Ao responder se as Forças Armadas poderiam atuar
em garantia dos poderes constitucionais, o advogado afirmou que sim”.
Tal interpretação enviesada do artigo constitucional 142, diz a
representação,  “é o que se busca como embasamento para que os
golpistas possam gerar uma insurreição. Por conta disso, Mauro Cid

armazenou, na época do segundo turno, em seu celular, um arquivo
denominado “Análise Ideia Ives Gandra”, o qual afirmava que, diante de
invasão de um Poder sobre as atribuições de outro, a Constituição
Federal permitiria que as Forças Armadas atuassem pontualmente, a fim
de restabelecer a harmonia constitucional, ou seja, atuar como poder
moderador”.

Na avaliação das entidades que representaram contra o jurista na OAB,
“a interpretação do jurista Ives Gandra, além de inconstitucional, não
deve nem ao menos ser chamada de doutrina minoritária, tendo em vista
que sua perspectiva ocorre apenas dentro de sua própria linha de
raciocínio, não sendo essa acompanhada por nenhum outro
constitucionalista”. Além disso, lembram, a Câmara emitiu parecer
esclarecendo que o artigo 142 não autoriza a intervenção militar.
De acordo com Carlos Nicodemos, advogado das entidades, “o exercício
regular da profissão, não é ilimitado, ou seja, não pode tudo. Não pode,
por exemplo, atentar contra o Estado de Direito em especial,
considerando, inclusive, o compromisso ético estatutário da advocacia
com a democracia”.
Para justificar a representação, as entidades alegam que a atitude de
Gandra Martins não está de acordo com o Estado democrático de direito,
nem com o Código de Ética da OAB, o qual estabelece que o advogado
deve “pugnar pelo cumprimento da Constituição e pelo respeito à Lei,
fazendo com que esta seja interpretada com retidão, em perfeita sintonia
com os fins sociais a que se dirige e as exigências do bem comum”.
Diante de tal afirmativa, diz a ação, “é notório que uma interpretação
distorcida da constituição, a qual foi capaz de compor uma tentativa de
golpe de estado, não demonstra um alinhamento com os princípios do
Estado Democrático de Direito”.

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