Clemente, patrocinado pela CUT, diz que chegou a hora de dividir os trabalhadores

“Não se pode perder tempo. É urgente atuar. Não se pode titubear. É
urgente reunir força política e avançar” é o grand finale da segunda

versão de seu documento

Em dissintonia com a maioria das centrais, confederações e federações, e com o
patrocínio da CUT, Clemente Ganz Lúcio, assessor executivo do Fórum das
Centrais, uma espécie de CEO sindical, afirmou que “a hora é agora” – para virar
de ponta cabeça o sistema sindical brasileiro: “Não se pode perder tempo. É
urgente atuar. Não se pode titubear. É urgente reunir força política e avançar” é o
grand finale da segunda versão de seu documento “Valorização das Negociações
Coletivas”.
Diz, de forma enviesada, o texto de Clemente: “Trata-se de sintonizar um sistema
que valoriza e fortalece a negociação coletiva em múltiplos âmbitos de
negociação, realizada por entidades sindicais de ampla base de representação e
alta representatividade, capazes de celebrar convenções e acordos coletivos que
irão efetivamente reger as relações de trabalho”.
“Dado o esfacelamento da nação, é imprescindível que a gente possa

estabelecer o bom diálogo entre nós”

Noutra dimensão, o presidente da CTB, Adilson Araújo, na manifestação unitária
das centrais contra os juros escorchantes, afirmou “que estamos diante de uma
encruzilhada histórica, dado o esfacelamento da nação. É imprescindível que a
gente possa estabelecer o bom diálogo entre nós”.
A COLHEITA

Moacyr Auersvald, presidente em exercício da Nova Central e vice-presidente da
Confederação Nacional dos Trabalhadores em Turismo e Hotéis (Contratuh),
afirmou, em entrevista ao HP, que o documento apresentado por Clemente, que
circula entre os sindicatos, está “cheio de pegadinhas”. “Está colocado que é um
projeto pela valorização e fortalecimento da negociação coletiva, mas esse
documento tem questões que trazem profundas alterações na estrutura sindical.
Comentou que o documento, que já foi divulgado pela grande imprensa, “não foi
discutido pelo Fórum das Centrais”. Qualificou o acontecido de “lamentável” e
assinalou: “Está a serviço das três maiores centrais (CUT, Força Sindical e UGT).
“Nós não comungamos com esta história”, concluiu.
“É fundamental retomar o Ministério do Trabalho como um efetivo órgão

de vigilância aos direitos dos trabalhadores”

Sabino Bussanello, assessor da Federação dos Trabalhadores na Indústria de
Santa Catarina, articulador do Fórum Sindical Ampliado (FAP), que agrega cerca
de 300 sindicatos e federações do sul do país, mais de um milhão de
trabalhadores, magistrados, procuradores e membros do Ministério do Trabalho,
falou para os leitores do HP em nome do movimento.
Afirmou que precisamos recuperar com urgência, “pelo menos o mais importante,
o que nos foi tirado nas reformas de Temer e Bolsonaro”. Para Sabino, é
fundamental retomar o Ministério do Trabalho “como um efetivo órgão de
vigilância aos direitos dos trabalhadores – com profissionais capazes e estrutura
de trabalho. Um ministério que defenda a liberdade e autonomia sindical e

fortaleça a negociação coletiva. Todo acordo tem que ter a presença do
sindicato”.
Considera “vital e urgente um sistema de custeio para as entidades sindicais,
aprovado em assembleia”. Enfatizou que deve estar entre as prioridades resgatar
a Justiça Trabalhista.
“Imagina eu achar que o governo Bolsonaro, desastroso, abriu espaço
para uma jornada de conquistas históricas ou mirabolantes”
Por último, Sabino afirmou que “levar em conta a correlação de forças é um
caminho virtuoso. Imagina eu achar que o governo Bolsonaro, desastroso, abriu
espaço para uma jornada de conquistas históricas ou mirabolantes. Para a mais
completa liberdade sindical. Que o empresariado vai sentar na mesa e, com os
trabalhadores organizados dentro de sua fábrica, ouvir nossos especializados
argumentos, para então, chegarmos a excelentes acordos. Parece que os
materiais do Fórum das Centrais, que vêm sendo divulgado nos sindicatos, estão
fora da realidade. A consequência é que vamos perder onde podemos avançar.
José Reginaldo, da executiva nacional da Nova Central, considera que, “com isso,
a pirâmide sindical se altera, consequentemente a autonomia e a liberdade
sindical são duramente atacadas, levando a reboque o rechaço às negociações
derivadas de reivindicações deliberadas em assembleia, das quais só os sindicatos
têm capacidade real para realizá-las”. E acrescenta que “a gana para a
prevalência do negociado sobre o legislado é tanta que, na realidade, o âmbito de
negociação, derivado do monopólio sindical impositivo, tende a agravar a
desestruturação do processo negocial e, fatalmente, da proteção social do
trabalho e, mais ainda do sindicalismo originário”.
DIVISÃO

Na primeira versão do texto, Clemente propõe a criação do CART (Conselho de
Autorregulação das Relações de Trabalho) com três câmaras. A presidência da
Câmara dos Trabalhadores será realizada em rodízio entre as três maiores
centrais, e a Câmara irá aferir a representatividade das entidades sindicais.
Propõe que as federações e confederações sejam mantidas como parte da
estrutura sindical no período da transição (10 anos), tendo critérios para a
agregação e de mensuração de representatividade e de representação. Quando
fizerem parte da organização de uma central sindical, sua existência e
funcionamento dependerá da forma autônoma de organização da Central.

TEMPESTADE

“O modelo sugerido nesse projeto, em vez de fortalecer os sindicatos e o
sistema confederativo, busca dar poder absoluto para as centrais
sindicais e estabelecer protagonismo apenas para três delas”
Comandante Carlos Müller, presidente da Conttmaf (Confederação Nacional dos
Trabalhadores no Transporte Marítimo e Fluvial) e da executiva nacional da CTB,
em nota, declarou que “o modelo sugerido nesse projeto, em vez de fortalecer os
sindicatos e o sistema confederativo, busca dar poder absoluto para as centrais
sindicais e estabelecer protagonismo apenas para três delas”.
O princípio da unicidade sindical, previsto no artigo 8º da Constituição Federal,
está sendo atacado e a representação ampla dos trabalhadores poderá ser
enfraquecida. Para as empresas, continuaria existindo a representação por

categoria econômica, ao passo que para os trabalhadores a representação poderia
ser flexibilizada por ramo de atividade. O papel do Ministério do Trabalho passaria
a ser feito por um Conselho das Centrais Sindicais, presidido por três delas
apenas, em sistema de rodízio, privatizando essa atividade, na prática, em
prejuízo do conjunto das demais centrais, das confederações, federações e
sindicatos.
João Domingos, presidente da CSPB (Confederação dos Servidores Públicos do
Brasil) e dirigente da executiva nacional da Nova Central, por nota da entidade,
disse que “hoje o modelo brasileiro reconhece os sindicatos como a célula
principal do Sistema Confederativo e principal instrumento de luta, de
representação e de representatividade dos trabalhadores e trabalhadoras, sendo
as Federações e as Confederações estruturas complementares, encarregadas de
organizar nos níveis superiores as categorias para fazerem o enfrentamento das
demandas apresentadas pela base. Nesse modelo, as Centrais Sindicais atuam
como agentes agregadoras das demandas, sem poder de representação e
negociação direta em favor dos trabalhadores”.
“O próprio texto apresentado aponta que as confederações e federações
que não migrarem para a estrutura orgânica das centrais sindicais

deverão ser extintas”

A proposta sugerida inverte essa pirâmide e as centrais sindicais passam a ser as
responsáveis pela negociação dos acordos, os demais integrantes do sistema
confederativo seriam meros agentes da ação das centrais.
Além disso, o próprio texto apresentado aponta que as confederações e
federações que não migrarem para a estrutura orgânica das centrais sindicais
deverão ser extintas, demonstrando claramente a intenção dessas entidades de
submeterem o Sistema Confederativo brasileiro.
O presidente da CSPB considerou a tentativa de subverter o modelo de
representação sindical como uma reedição dos projetos trazidos pelo extinto
Fórum Nacional do Trabalho, estabelecido em 2003, na primeira gestão do
presidente Lula.
Antonio Neto, presidente da CSB (Central dos Sindicatos Brasileiros), em
entrevista na FSP, declarou que os esforços dos dirigentes sindicais devem ser
concentrados na revogação da reforma trabalhista, aprovada em 2017, e na
recuperação de mecanismos de negociação coletiva e não na proposta de reforma
sindical. Neto defende que é necessária a recuperação dos mecanismos de
negociação coletiva no mundo do trabalho e reconstruir os meios de
financiamento das entidades sindicais atingidos pela reforma trabalhista do
governo Michel Temer.

REVIRAVOLTA

Ricardo Patah, um dos principais articuladores do documento, presidente da UGT
e do Sindicato dos Comerciários de São Paulo, depois que a coisa “vazou” na
imprensa, o que provocou uma chiadeira geral nos filiados da UGT, distribuiu um
vídeo descalçando a iniciativa e esclarecendo que o essencial para ser repactuado
com os empresário e o governo é a homologação das contas do trabalhador voltar
para o seio do movimento sindical, mesmo que seja por videoconferência; a
ultratividade, isto é a garantia dos direito conquistados no último acordo até que
se chegue ao próximo; o direito de qualquer uma das partes pedir dissídio na
justiça; toda negociação, obrigatoriamente, ter a presença do sindicato e a
autonomia das assembleias sindicais de decidirem pela contribuição negocial.

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