No período Bolsonaro, garimpo ilegal tem até estrada em terra indígena

Omissão do governo com fiscalização e direitos dos povos originários
leva garimpo a se sentir à vontade para atuar, inclusive criando estrada

de 150 km em terra indígena

Estrada aberta na Terra Yanomami. Foto: Ibama/Divulgação
Nova denúncia veiculada neste domingo (11) demonstrou mais uma vez
a grave situação vivida pelos povos originários brasileiros devido à ação
ilegal de garimpeiros. Conforme mostrou o programa Fantástico, da TV
Globo, foi aberta uma estrada clandestina de 150 quilômetros, dentro da
Terra Indígena Yanomami, usada para o trabalho de criminosos que
extraem minérios na região e impõem uma rotina de violência, doenças e
desassistência aos indígenas, situação que desandou sob o governo de
Jair Bolsonaro (PL).
A Terra Indígena Yanomami — maior reserva do país com mais de 10
milhões de hectares e 30 mil habitantes — está localizada entre os
estados do Amazonas e Roraima. Segundo a Hutukara Associação
Yanomami (HAY), somente em 2021, o avanço do garimpo sobre essa
localidade foi de 46%, o que configura a maior devastação da área desde
quando houve sua demarcação e homologação, há 30 anos. Entre 2016
e 2020, o garimpo nessa área cresceu impressionantes 3.350%. Ainda
de acordo com a Hutukara, o garimpo hoje impacta 56% da terra
Yanomami, onde os casos de malária explodiram a partir de 2017.

A descoberta da estrada em meio ao território dessa etnia mostra a alta
estruturação desses grupos criminosos, que se sentem encorajados a
atuarem ao arrepio da lei diante da leniência do Estado brasileiro e do
desmonte das estruturas de fiscalização, como o Ibama.
Ainda assim, a atuação dos servidores desse órgão levou à destruição,
no dia 8, de uma escavadeira — a quarta encontrada em apenas uma
semana. Nas imagens exibidas pela reportagem, é possível ver outros
equipamentos como este no local, assim como foram mostrados
helicóptero e avião de pequeno porte usados pelos criminosos. Também
foram localizadas estruturas que dão suporte local aos garimpeiros,
inclusive estoques de combustíveis.
Ao programa, Hugo Ferreira Neto Loss, analista ambiental e fiscal do
Ibama, disse que “hoje, ali na Yanomami, a gente pode dizer, com
certeza, que existe uma relação estreita entre o garimpo e as facções
criminosas ali dentro. Assim que a presença da polícia se fez lá no rio, a
gente observou que eles começaram a soltar fogos. Então, esse é um
sinal de alerta que eles dão, típico de facção criminosa, para poder avisar
que existe ali a presença da polícia”.
Devastação da vida indígena

Além do cenário de devastação ambiental, a atuação dos garimpeiros
nessas áreas tem levado fome, miséria, medo e doenças e dificultado a
assistência aos indígenas. Os povos locais sofrem com ameaças e
episódios constantes de violência e têm suas águas poluídas por metais
pesados, o que leva à morte de animais e à piora nas condições de
saúde da população local, inclusive com graves casos de desnutrição.
Os anos de Bolsonaro foram marcados, ainda, pela leniência e
encorajamento implícito a ações ilegais por parte de garimpeiros e do
agronegócio, assim como foram paralisadas as demarcações e avançou
o desmonte de estruturas como Funai e Ibama. De acordo com o
relatório “Violência Contra os Povos Indígenas no Brasil 2020, do
Conselho Indigenista Missionário (Cimi), em dois anos de governo de
Bolsonaro houve aumento de 137%, em relação a 2018, nas invasões a
terras indígenas e o número de assassinatos de indígenas teve alta de
61% — apenas em 2020, foram 182.
No que diz respeito à saúde indígena, vale lembrar que em setembro
deste ano, o governo Bolsonaro bloqueou R$ 250 milhões do orçamento
previsto para essa frente e faltam recursos também para a área de
assistência social, o que atinge também essa população.
A situação deplorável em que vivem os povos originários está sendo
levantada pelo grupo de transição de Lula, que pretende criar uma
estrutura própria para a área. Na avaliação da deputada federal eleita
Sônia Guajajara (PSol), que faz parte da coordenação do Grupo de
Trabalho dos Povos Originários, “o agravamento da invasão garimpeira,
junto com a desassistência do Dsei (Distrito Sanitário Especial Indígena),
fez explodir o aumento de doenças infecciosas e desnutrição a níveis
desumanos. É urgente a atuação nesse território para a desintrusão dos
invasores e cuidado com a população Yanomami”.
Também integrante do GT, a deputada Joênia Wapichana (Rede-RR),
que também compõe a Comissão Externa para acompanhar a Situação
do Povo Yanomami da Região Waikás (Cexwaika), “não há dúvidas de
que a atividade garimpeira é incompatível com os territórios tradicionais,
na medida em que degrada o meio ambiente e os modos de vida dos
indígenas, gerando violação aos direitos constitucionais da vida, da
dignidade e do usufruto de terras indígenas”.

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