Adeus ao dólar: depois dos Brics, Oriente Médio avança na desdolarização

Dólar corresponde a 58% das reservas estrangeiras oficiais, bem menos
do que os 73% de 2001. No fim dos anos 1970, o percentual era de 85%.

O dólar continua a sangrar – e desta vez não é por causa dos Brics (o
bloco de países emergentes formado por Brasil, Rússia, Índia, China e
África do Sul). Ao que tudo indica, vivemos o declínio do império da
moeda que, desde 1944, é base do sistema de padrão-ouro imposto pela
Conferência de Bretton Woods.
Conforme a agência alemã Deutsche Welle, a bola da vez é o Oriente
Médio. O rigor das sanções econômicas e comerciais anunciadas pelos
Estados Unidos contra a Rússia, em decorrência da guerra na Ucrânia,
foi o estopim para mais uma rodada de buscas por alternativa ao dólar. É
consenso na região que os Estados Unidos estão usando sua moeda
como arma política.
“Há uma impressão de que os Estados Unidos estão tentando reescrever
as regras do mercado mundial de petróleo para afetar os interesses
russos – e isso representa uma ameaça estratégica para a Arábia
Saudita”, diz o pesquisador Hasan Alhasan, do Instituto Internacional de
Estudos Estratégicos, em Londres.
Pesa contra os Estados Unidos – e também contra a União Europeia – o
simbolismo de uma medida vista como descabida: o congelamento de
ativos do banco central russo mantidos em suas jurisdições.
“Há um sentimento de preocupação com o uso sem precedentes, pelos
EUA e também pela UE, do comércio e das finanças internacionais como
armas, no contexto da guerra com a Rússia”, avalia Alhasan. Qual a
resposta mais imediata dos países do Oriente Médio? “Eles estão se
preparando para um mundo global mais multipolar, no qual querem estar
bem posicionados para atuar dentro e fora das zonas dolarizadas”.
O Iraque é um dos países que, recentemente, começou a fazer negócios
com a China usando o yuan, enquanto os Emirados Árabes Unidos
cogitam a rúpia indiana para comercializar produtos com a Índia. O Egito
– que negociava com iene – diz que recorrerá também ao yuan. A Arábia
Saudita estuda vender petróleo com pagamento em euro, yuan e outras
moedas.
O “adeus ao dólar” pode aproximar o Oriente Médio dos Brics – países
como Egito, Arábia Saudita, Emirados Árabes Unidos, Argélia e Bahrein
já pediram para entrar no grupo. Ao mesmo tempo, a Rússia diz que o
próximo encontro do bloco, em junho, terá como pauta a criação de uma
moeda comercial única para transações internas.
A Bloomberg apresentou uma estatística que evidencia a desdolarização
em curso: “o dólar corresponde a 58% das reservas estrangeiras oficiais,
bem menos do que os 73% de 2001. No fim dos anos 1970, o percentual

era de 85%”. Na região do Golfo Pérsico, a maioria dos países ainda tem
moedas atreladas ao dólar.
Mas o “fator Ucrânia” levou essas nações a ligarem o alerta, diz o
cientista político Daniel McDowell, da Universidade Syracuse, de Nova
York. A Casa Branca, sob o governo Joe Biden, tem usado o dólar de
modo vergonhoso para pressionar a Rússia – e o Oriente Médio sabe
que, mais cedo, mais tarde, pode ser a vítima.
“Quanto mais os Estados Unidos usarem o dólar como arma de política
externa, mais seus adversários vão mover suas atividades econômicas
internacionais para outras moedas”, explica McDowell. “Governos que
temem sanções americanas estão cada vez mais pensando em como ir
adiante, mesmo que eles ainda não estejam prontos ou interessados em
fazer um afastamento radical do dólar.”

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