Senado vai investigar elo entre joias e venda de refinaria pela metade do preço

A Federação Única dos Petroleiros protocolou ao MPF pedido de
investigação sobre o caso na terça (7). Leia entrevista

Bolsonaro nos Emirados Árabes e a refinaria baiana

O senador Omar Aziz (PSD-AM), recém-eleito para presidir a Comissão
de Transparência e Fiscalização, disse que vai investigar a possível
relação entre a venda de uma refinaria e as joias recebidas como
presente do governo da Arábia Saudita pelo governo de Jair
Bolsonaro (PL).
A suspeição foi levantada nesta semana pela Federação Única dos
Petroleiros (FUP) ao representar na Procuradoria Regional da República
do Distrito Federal, pedindo abertura de inquérito civil público e ação
judicial para investigar a relação entre as joias e a venda da refinaria
Landulpho Alves (RLam), na Bahia.
O Portal Vermelho falou com o coordenador-geral da Federação Única
dos Petroleiros, Deyvid Bacelar, sobre a representação. Ele é lotado na
refinaria desde que era RLam e conta os efeitos da privatização. (Leia
entrevista logo mais abaixo).
Toda a argumentação do senador Aziz se assemelha a que é
apresentada pela FUP à PR-DF. Ele disse que a comissão vai investigar
a venda da refinaria da Petrobras Landulpho Alves (RLam), localizada na
Bahia. Segundo várias agências de avaliação, a negociação foi feita
abaixo do preço de mercado. A refinaria avaliada entre US$ 3 e 4 bilhões
foi vendida por US$ 1,8 bilhão em 2021.
O senador disse que, na semana que vem, se reunirá com os integrantes
da comissão para definir os primeiros passos da investigação. Ele pedirá
informações apuradas pela Receita Federal e pela Polícia Federal.
Aziz quer investigar a possível ligação do baixo valor pago pelo grupo
dos Emirados Árabes com as joias dadas pela Arábia Saudita ao governo
Bolsonaro. Os países são vizinhos e parceiros estratégicos.
Aziz disse que a comissão já enviou um pedido de documentos à
Petrobras acerca da avaliação de preço da refinaria.
Qualquer violação aos interesses da União, relação com a tentativa de
descaminho de joias, ou qualquer ato que tenha gerado vantagens a
autoridades nessa venda, será levado à Justiça para punição dos
envolvidos.”Omar Aziz (PSD-AM), senador
“A forma como se deu o caso foi bastante estranha. Se fosse uma
propina de 3 milhões de euros, seria muito difícil transportar num voo
normal. Mas isso, transformado em diamante, que não perde nunca o
valor… [Há] valor agregado ali”, afirmou o senador.

A Landulpho Alves, agora chamada Marataipe, produz diesel, gasolina,
óleo combustível e bunker, além de produtos especiais, como parafina e
propeno.

Então, Bolsonaro afinal teria trocado uma refinaria de petróleo por
“pedrinhas brilhantes”?
É o que tudo indica. Fizemos essa denúncia ao Ministério Público
Federal justamente para que isso seja investigado. Mas há fortes
indícios, sim, de que há uma relação entre as joias de R$ 16,5 milhões
que seriam entregues a ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro, e o
processo de privatização da refinaria Landulpho Alves. Ela fora vendida
por metade ou menos ainda do seu valor. Esta avaliação de preço foi
feita pelo Ineep (Instituto Nacional de Estudos Estratégicos do Setor de
Petróleo e Gás) e pelo próprio BTG Pactual.
Na época que aconteceu esta venda, como repercutiu essa
diferença de valores?
Até mesmo agentes do mercado sinalizaram que a refinaria estava sendo
vendida a um preço muito abaixo da sua avaliação. A própria XP
Investimento fez uma avaliação muito similar a do BTG. Mesmo assim, o
processo andou sem qualquer processo licitatório, sem debate algum
com a sociedade, já que ali se constituiu um monopólio regional, e sem o
aval do Congresso Nacional, que é muito pior. Desrespeitou-se a
Constituição e até mesmo a lei que os liberais criaram no governo FHC,
que é o Plano Nacional de Desestatização.
São tantos equívocos nessa venda, que já caberiam investigações que
não foram feitas. Apesar das inúmeras denúncias que a FUP fez, das

ações judiciais na Justiça Federal, apesar da reclamação do Congresso
Nacional na Suprema Corte brasileira, a privatização avançou ao ponto
do negócio ser fechado.
Agora, quando o ex-presidente diz que quando esse presente tinha sido
acertado nos Emirados Árabes, ele não estava presente, e já estava no
Brasil, e esse presente chegou via ministro de Minas e Energia, Bento
Albuquerque, ou ele comete um ato falho, ou se entrega reconhecendo
que existia uma ligação entre essas joias e o processo de privatização.
Afinal, isso tudo ocorreu no mesmo período.
Em outubro de 2021, quando infelizmente a refinaria já tinha sido
privatizada para o fundo Mubadala, – que é um fundo soberano de Abu
Dabhi, nos Emirados Árabes -, as jóias foram presenteadas pela Arábia
Saudita, que é um país vizinho. Mas os dois países mantém relações
comerciais bilionárias, através do próprio fundo Mubadala, que tem
capital e investimentos nos Emirados e na Arábia Saudita, entre outros
países.
Na verdade, tudo parece um grande ato falho de conexões entre
Ministério de Minas e Energia, jóias presenteadas pela Arábia,
refinaria para os Emirados, tentativa de entrar ilegalmente com as
joias, carteiradas e versões ajustadas a todo momento entre os
envolvidos. O que vocês esperam com esse pedido feito na
representação?
Esperamos que a representação se torne de fato um inquérito civil. Que
investigações profundas sejam feitas e que se identifique o que estamos
denunciando, desde o início do processo de privatização da refinaria.
A nosso ver, a privataria bolsonarista além de trazer problemas para a
população brasileira e para a própria Petrobras, ela trouxe benesses para
alguns setores, como o capital financeiro internacional, grandes
empresas transnacionais, e, nesse caso, estamos falando de um fundo
soberano que é um fundo de investimento dos Emirados Árabes.
Além das ações judiciais que existem, inclusive a mais importante é a
que está na Suprema Corte, no STF, que é avaliar o mérito do processo,
a reclamação do Congresso Nacional acerca da inconstitucionalidade da
privatização. Não foi finalizado este julgamento.
Temos expectativa que tenhamos êxito, principalmente num governo
popular, democrático e desenvolvimentista, em que novos ares sopram,
inclusive junto ao judiciário brasileiro.
Caso essa relação se configure um crime, isso pode ter efeitos para
a refinaria?

Sem dúvida. O efeito principal que estamos perseguindo é o da reversão
dessa privatização ilegal e inconstitucional. E como disse, há fortes
indícios de relações escusas entre os Emirados Árabes, a Arábia Saudita
e o governo Bolsonaro. Se isso for confirmado, precisamos reverter a
privatização e a refinaria voltar a ser patrimônio do povo brasileiro, nas
mãos da Petrobras. Se isso vai envolver algum tipo de indenização ao
Estado, aos estados envolvidos, e também ao próprio fundo e à
Petrobras, não sabemos, mas o objetivo principal é a reversão da venda
desta primeira refinaria brasileira.
Qual foi o efeito desde que os árabes assumiram o controle sobre a
refinaria?
Infelizmente, houve uma redução dos postos de trabalho, tanto de
trabalhadores diretos e indiretos, próprios ou terceirizados. Eu sou lotado
na refinaria e quando ingressei em 2006, tínhamos 1.400 concursados da
Petrobras trabalhando, e algo em torno de 3 mil terceirizados. Esse
número se reduziu bastante. Hoje, temos algo em torno de 700
trabalhadores próprios da Acelen, – a empresa criada pelo fundo
Mubadala -, e em torno de 1.100 trabalhadores terceirizados.
O segundo efeito atinge toda a população da Bahia, e de boa parte do
Nordeste, que foi o encarecimento do preço dos combustíveis. Só não
são os mais caros, porque a refinaria de Manaus, também privatizada,
está em primeiro lugar. Se constituiu um monopólio regional controlado
por essa empresa, com mercado cativo, que aplica os preços que ela
quiser.
Infelizmente, essa é a prática quando ocorrem privatizações. A
minimização dos custos ao máximo, com efeito direto nas demissões,
que implica diretamente na economia local, e a maximização dos lucros,
custe o que custar, com retorno do investimento mais rápido possível.

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